Pau de Dois Bicos – Fábula de Monteiro Lobato
Um morcego estonteado pousou certa vez no ninho da
coruja, e ali ficaria de dentro se a coruja ao regressar não investisse contra
ele.
– Miserável bicho! Pois te atreves a entrar em minha
casa, sabendo que odeio a família dos ratos?
– Achas então que sou rato? Não tenho asas e não vôo
como tu? Rato, eu? Essa é boa!…
A coruja não sabia discutir e, vencida de tais razões,
poupou-lhe a pele.
Dias depois, o finório morcego planta-se no casebre do
gato-do-mato. O gato entra, dá com ele e chia de cólera.
– Miserável bicho! Pois te atreves a entrar em minha
toca, sabendo que detesto as aves?
– E quem te disse que sou ave? – retruca o cínico –
sou muito bom bicho de pêlo, como tu, não vês?
– Mas voas!…
– Vôo de mentira, por fingimento…
– Mas tem asas!
– Asas? Que tolice! O que faz a asa são as penas e
quem já viu penas em morcego? Sou animal de pêlo, dos legítimos, e inimigo das
aves como tu. Ave, eu? É boa…
O gato embasbacou, e o morcego conseguiu retirar-se
dali são e salvo.
Moral da Estória:
O segredo de certos homens está nesta política do
morcego. É vermelho? Tome vermelho. É branco? Viva o branco!
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