Molly
Whuppie
Joseph Jacobs
Era uma vez um homem e uma mulher que tinham
filhos demais e não conseguiam comida para eles. Pegaram então os três menores
e os abandonaram na mata. As crianças andaram, andaram, sem nunca avistar uma
casa. Logo começou a escurecer, e ficaram com fome. Finalmente viram uma luz e
caminharam rumo a ela; era uma casa. Bateram à porta e apareceu uma mulher, que
perguntou:
“O que desejam?”
E elas responderam:
“Por favor, deixe-nos entrar e nos dê alguma
coisa para comer:’ A mulher disse:
“Não posso, porque meu marido é um gigante, e
se chegasse em casa comeria vocês.” Elas imploraram: “Deixe-nos descansar só um
pouquinho”, disseram, “e iremos embora antes que ele chegue.” Ela as deixou
entrar, instalou-as diante do fogo e deu-lhes leite e pão; mas as crianças mal
tinham começado a comer quando se ouviu uma batida muito forte à porta, e uma
voz pavorosa disse:
“Fi-feu-fo-fum, farejo o sangue de um mortal.
Quem está aí com você, mulher?”
“Hum”, disse a mulher, “são três pobres meninas
com frio e com fome, e já vão embora. Não toque nelas, homem:’
Ele não disse nada, mas devorou um lauto jantar
e ordenou que elas passassem a noite toda ali. Ora, ele também tinha três
meninas, e elas iam dormir na mesma cama que as três forasteiras.A mais nova
das três meninas estranhas chamava-se Molly Whuppie e era muito esperta. Ela
notou que, antes de irem para a cama, o gigante passou cordas de palha em volta
do seu pescoço e do das irmãs, e correntes de ouro em volta do pescoço das
próprias filhas. Assim, Molly ficou atenta e não dormiu, esperando até se
certificar de que todos estavam mergulhados num sono pesado. Depois se
esgueirou da cama, soltou as cordas de palha do seu pescoço e do das irmãs e
tirou as correntes de ouro do das filhas do gigante. Pôs então as cordas de
palha nas meninas do gigante e as de ouro em si mesma e nas irmãs e se deitou.
No meio da noite o gigante se levantou, armado
de um enorme porrete, e procurou os pescoços com a palha. Estava escuro. Ele
tirou as filhas da cama e, no chão, surrou-as até matá-las, depois foi de novo
se deitar, pensando que tinha se dado bem. Molly, achando que era hora de cair
fora dali com as irmãs, acordou-as, disse-lhes que ficassem bem quietinhas, e
todas fugiram sorrateiramente da casa.
Saíram sãs e salvas e correram, correram, sem
nunca parar até de manhã, quando viram uma magnífica casa diante de si. Era a
casa de um rei; Molly entrou e contou sua história ao rei. Ele disse: “Bem,
Molly, você é uma menina esperta e realizou uma proeza; mas se quisesse
realizar uma proeza maior ainda, e voltar para furtar a espada do gigante, que
fica pendurada atrás da cama dele, eu daria meu filho mais velho em casamento à
sua irmã mais velha.” Molly disse que tentaria. Assim ela voltou, conseguiu penetrar
na casa do gigante e se meteu debaixo da cama. O gigante chegou em casa, comeu
um lauto jantar e foi se deitar. Molly esperou que ele começasse a roncar e
avançou furtivamente, esticou o braço por cima dele e pegou a espada; mas no
instante em a passava sobre a cama, ela tilintou.
O gigante deu um pulo e Molly saiu porta afora,
levando a espada. Correu, correu, até que chegou à Ponte de um Cabelo. Molly
conseguiu passar, mas o gigante não, e disse:”Maldita seja, MollyWhuppie! Nunca
mais volte aqui.” E ela respondeu: “Duas até agora, grandalhão, vou-me embora
para a Espanha:’ Assim, Molly levou a espada para o rei e sua irmã se casou com
o filho dele.
“Bem”, o rei disse, “você realizou uma proeza;
mas se realizasse uma ainda maior e furtasse a bolsa que fica debaixo do
travesseiro do gigante eu casaria sua segunda irmã com meu segundo filho.” E
Molly disse que tentaria.
Assim, partiu para a casa do gigante, entrou
nela de mansinho, escondeu-se de novo debaixo da cama, e esperou o gigante
terminar seu jantar e roncar num sono profundo. Saiu do seu esconderijo, enfiou
a mão debaixo do travesseiro e puxou a bolsa. Mas no instante em que estava
saindo o gigante acordou e correu atrás dela. E ela correu, e ele correu, até
que chegaram à Ponte de uni Cabelo, e ela passou, mas ele não conseguiu, e
disse: “Maldita seja, Molly Whuppie! Nunca mais volte aqui.”
“Mais uma vez, grandalhão”, ela exclamou,
“vou-me embora para a Espanha:’
Assim Molly levou a bolsa para o rei, e sua
segunda irmã se casou com o segundo filho do rei. O rei disse então a Molly:
“Molly, você é uma menina esperta, mas se fizesse melhor ainda e furtasse o
anel que o gigante usa no dedo eu lhe daria meu filho mais moço em casamento.”
Molly disse que tentaria.
Assim, lá foi ela de novo para a casa do
gigante, e se escondeu debaixo da cama. O gigante não demorou muito a chegar e,
depois de dar cabo de um lautíssimo jantar, foi para a cama e logo estava
roncando alto. Molly se esgueirou, esticou o braço por cima da cama, segurou a
mão do gigante e puxou, puxou até conseguir arrancar o anel. Mas no instante em
que o pegou, o gigante acordou, agarrou-a pela mão e disse: “Desta vez peguei
você, MollyWhuppie, e, se eu lhe fizesse tanto mal quanto me fez, o que faria
comigo?”
Molly disse: “Enfiaria você num saco e meteria
junto lá dentro o gato, e mais o cachorro, e uma agulha e linha e tesoura, e
penduraria você na parede, e iria até a mata, e escolheria a vara mais grossa
que pudesse encontrar, e voltaria para casa, despenduraria você e surraria até que
morresse.” “Bem, Molly,” disse o gigante, “é isso mesmo que vou fazer com
você:’ Apanhou um saco e enfiou Molly dentro, e junto com ela o gato e o
cachorro, e uma agulha e linha e tesoura. Pendurou o saco na parede e foi para
amata escolher uma vara. Quanto a Molly, ela cantou: “Ah, se visse o que estou
vendo!”
“Oh!”, perguntou a mulher do gigante. “O que
está vendo, Molly?”
Mas Molly não dizia uma palavra a não ser: “Ah,
se visse o que estou vendo!”
A mulher do gigante implorou a Molly que a
deixasse entrar no saco para ver o que ela estava vendo. Assim, Molly pegou a
tesoura e cortou um buraco no saco e, levando consigo a agulha e a linha, pulou
fora, ajudou a mulher do gigante a se enfiar lá dentro e costurou o buraco. A
mulher do gigante não viu patavina, e começou a pedir para sair de novo. Mas
Molly não fez o menor caso e tratou de se esconder atrás da porta.
Eis que chegou o gigante, uma árvore enorme na
mão, e desceu o saco e começou a surrá-lo. Sua mulher gritava “Sou eu, homem”,
mas o cachorro latia e o gato miava e ele não reconheceu a voz da esposa. Então
Molly saiu de detrás da porta e o gigante a viu e saiu atrás dela; e ele
correu, e ela correu, até que chegaram à Ponte de um Cabelo, e ela passou mas
ele não pôde. E ele disse: “Maldita seja, MoilyWhuppie! Nunca mais volte aqui.
“Nunca mais, grandalhão”, ela exclamou. “Vou-me
embora de novo para a Espanha:’
Assim Molly levou o anel para o rei e se casou
com o seu filho caçula e nunca mais viu o gigante de novo.
Joseph Jacobs
(versão brasileira)
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