sexta-feira

Ovos frescos, de António Torrado


Ovos frescos



Era uma vez um açafate com ovos. Puseram-se à conversa. Eram ovos ainda frescos e tinham ambições. Um deles disse:
- Quem me dera a mim fazer-me em fios de ovos, a enfeitar um bolo...
- Não está má a pretensão - comentou um outro. - Pois eu preferia ajudar umas fatias douradas a ficar mais douradinhas.
- Fritos, não - cortou um terceiro. - Mas, numa gemada com açúcar, já eu entrava com gosto.
Outro ovo confessou:
- Gostava tanto de ser ovo estrelado. Estrelado vem de estrela... Deve ser bonito. Mas, não podendo ser, qualquer uso serve. Um ovo nunca passa despercebido.
Só faltava um.
- E tu o que queres ser? - perguntaram os outros.
- O ovo de Colombo.
Vamos fazer-lhe a vontade.
Como vocês sabem, Cristóvão Colombo descobriu a América. Quando regressou a Espanha, trazendo a notícia da sua descoberta, os fidalgos da corte, invejosos, desdenharam do feito. Isso também eles eram capazes. Bastava lá ir. Então, Colombo mostrou-lhes um ovo e disse-lhes:
- Ponham-no de pé.
Eles tentaram. Insistiram. Obstinaram-se.
- Não é possível - concluíram.
- Pois eu consigo - disse Colombo.
Muito ao de leve, bateu na mesa com a parte mais redonda e cheia do ovo, a casca amolgou-se, mas só um bocadinho, e o ovo ficou de pé.
- Que fácil - comentaram os fidalgos. - Isso também nós éramos capazes.
- Mas não o fizeram. Quem pôs o ovo de pé, quem descobriu um novo continente fui eu. Cabe-me o mérito a mim.
Aqui têm como eu fiz a vontade ao ovo que queria ser ovo de Colombo.
E agora? Agora, já satisfeito, vai juntar-se aos outros e, todos juntos, vão fazer uma omeleta.


António Torrado

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