sexta-feira

O dragão das nove e trinta, de António Torrado


O dragão das nove e trinta

Leva uma rica vida o dragão da minha história. É verde, como dizem que são os dragões, tem escamas que o cobrem de cima a baixo e uma espinha eriçada em dentes de serra, do pescoço ao rabo. Como se vê, é um dragão vulgar.
Agora imaginem-no, como eu imagino, carregado de meninos. Imaginar não custa nada.
Nestes dias de Verão, por volta das nove e trinta, passa pela minha rua, deitando muito fumo pelas ventas, o dragão de que vos falo.
Pára nas paragens dos autocarros e para ele sobem os meninos em férias. Quando estão todos instalados, o dragão buzina alegremente e põe-se a andar. Não sabiam que os dragões buzinavam? Pois buzinam, mas só quando estão bem-dispostos.
Com o seu carregamento de meninos, o dragão toma o caminho da praia. Corre ao lado do comboio, que também leva o mesmo sentido, e quase sempre chega primeiro.
Na praia, assim que o último menino salta para a areia, o dragão mete-se dentro de água, faz-se pequenino e transforma-se num hipocampo, isto é, num cavalo-marinho, para poder nadar sem chamar a atenção. Perder a banhoca é que nunca!
Ao fim da tarde, volta a crescer e a apresentar-se como um dragão aprumado e responsável, que nunca se esquece de que tem de trazer os meninos de volta para casa.
À noite, trabalha na Feira Popular. Como tem uma bocarra lança-chamas, ocupa-se a assar frangos ou sardinhas. E, sempre que pode, vai dar uma voltinha no carrossel. Rica vida!


António Torrado

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