As quatro estações
Era uma vez um rei chamado Sol. Todos o conhecem.
Todos o estimam.
Poderoso, os seus raios são espadas. Majestoso, os
seus raios são de ouro e mais do que todo o ouro valem. Generoso, os seus raios
são fios de vida.
Poderoso, majestoso e generoso era este rei, mas tinha
um grande desgosto – os seus quatro filhos davam-se muito mal uns com os
outros.
Chamavam-se os quatro irmãos, por ordem de idade, a
começar pelo mais novo: Primavera, Verão, Outono e Inverno. Bulhavam constantemente,
porque todos queriam, à uma, governar a Terra. Ora isto não podia ser.
Assim pensando, o rei Sol decidiu que cada um deles
governasse por sua vez, durante um certo tempo. As ordens de um pai, para mais
rei, e ainda por cima Sol, têm de se cumprir.
O Outono não gostava desta partilha. Queixava-se de
que lhe não davam tempo... Ainda estava ele a arrumar e a alindar a casa,
pintando tudo da cor púrpura, em tons e meios-tons amarelos doirados, e já o
Inverno lhe batia à porta. Então o Outono tinha uma birra e arrancava as folhas
das árvores, algumas ainda por pintar...
Saía o Outono com lágrimas nos olhos e entrava o
Inverno.
— Em que desordem isto está — exclamava ele, irritado.
E punha-se a varrer. Varria com tanta força que fazia vento. Depois lavava, em
grandes bátegas, caídas do céu... As sementes e os grãozinhos, que o Outono
deitara à terra, assustavam-se:
— Iremos nós também na cheia? — perguntavam uns para
os outros.
O Inverno ouvia-os e dizia-lhes:
— Sosseguem! Durmam descansados. Vai tudo dormir um
longo sono. Assim tem de ser.
E tão carinhoso ele era que cobria os lugares mais
desprotegidos da terra com um manto branco de neve.
Lá fora, a Primavera impacientava-se. Não tinha feitio
para suportar os vagares do irmão. Às vezes, não se continha que não
perguntasse pela frincha da porta:
— Já posso?
Ainda era cedo, mas só de lhe ouvirem a voz, as
primeiras flores rompiam a terra.
Então, quando ela chegava, era uma festa. Corria a
Primavera de lés a lés e não havia ervinha, folha, haste, flor que não quisesse
dançar com ela. Era uma enorme roda de alegria.
Mas a folgança não podia continuar sempre. Cansada do
bailarico, a Primavera dava de bom grado o seu lugar ao Verão.
— Vamos trabalhar — dizia ele, assim que chegava.
E trabalhava-se, pois então! Os grãos e os frutos
amadureciam. As flores arrecadavam tesouros. Nas tocas, nos ninhos, nos
cortiços e por toda a parte, as palavras de ordem eram: trabalhar, colher,
guardar.
Enquanto, nas praias, uns gozavam as férias, outros,
no campo, não tinham descanso.
— O essencial fica feito. Deixo os retoques ao cuidado
do meu irmão Outono — dizia o Verão, à despedida.
Lá vinha o Outono, com pincel e tintas apurar as
cores. Achava sempre que merecia mais tempo. São tantas as tonalidades, do
verde-escuro ao castanho, do laranja ao vermelho... Não se pode fazer obra
asseada quando se sente os passos do Inverno a aproximarem-se. Que nervos!
Sorrindo no seu trono, o Sol acompanhava a obra dos
seus quatro filhos. Descansa. Eles estão a dar muito boa conta de si.
E o Sol, risonho, ainda mais resplandece.
António Torrado
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