Tiquinho
de Carvão
Joseph Jacobs
Uma senhora fez, um dia, cinco tortas. Quando
elas saíram do forno, estavam tão duras que não podiam ser comidas. Por isso, a
senhora disse à filha: "Querida, ponha as tortas na prateleira e deixe-as
lá, descansando um pouco, para ver se amolecem." A mocinha, que era muito
gulosa, disse consigo mesma: "Pois sim, eu vou comê-las de uma só
vez". E comeu-as, da primeira à última. Mais tarde, quando acabaram de
jantar, a senhora disse à filha: "Vá buscar uma daquelas tortas. Agora já
poderemos comê-la." A moça levantou-se da mesa, foi até a prateleira, onde
só havia pratos vazios, voltou e disse à mãe: "As tortas ainda não
amoleceram." "Nenhuma delas?" perguntou a senhora.
"Nenhuma!" respondeu a moça. "Bem, volte lá e traga-me uma de
qualquer maneira. Quero comê-la assim mesmo." resolveu a senhora.
"Mas é impossível, ainda estão muito duras." continuou a filha.
"Não faz mal", respondeu a mãe. "Veja a que estiver
melhor." "Melhor ou pior, você não poderá comer nenhuma, porque eu
comi todas." explicou a moça. A senhora ficou muito aborrecida. Apanhou a
roca* e foi fiar na varanda. Enquanto fiava, ia falando alto: "Que
vergonha! Minha filha comeu cinco tortas de uma só vez..."
O Rei tinha saído para passear. Quando passou
pela porta da casa da senhora, como não entendesse o que ela estava dizendo,
parou e perguntou-lhe: "O que você está dizendo, boa mulher?" Ela,
com vergonha do que a filha tinha feito, respondeu: "Eu estava dizendo que
minha filha hoje fiou cinco meadas de linha, meu Rei!" "Céus!"
exclamou o Rei. "Nunca ouvi dizer que alguém conseguisse fazer tal coisa.
Escute, eu preciso de uma esposa prendada e casar-me-ei com sua filha. Preste,
porém, muita atenção: durante onze meses no ano, ela poderá comer o que
desejar, usará as roupas que quiser e terá as companhias que mais lhe
agradarem. Entretanto, no último mês do ano, ela terá que fiar cinco meadas de
linha por dia ou, então, mandarei matá-la." "Muito bem!" disse a
senhora, que estava pensando apenas nas vantagens de ter a filha casada com o
rei. Quanto às cinco meadas que ela teria que fiar em cada dia do último mês,
bem... depois ela encontraria uma solução. Quem sabe, até lá, o Rei poderia
esquecer-se disso...
Casaram-se, então, o Rei e a mocinha. Durante
onze meses, de fato, ela comeu coisas gostosas, usou roupas bonitas e teve
companhias agradáveis. Quando já ia se aproximando o décimo segundo mês, ela
começou a pensar de que modo se arranjaria para fiar cinco meadas por dia.
Como, porém, o rei não se referisse ao assunto, ela pensou que ele o tivesse
esquecido. Todavia, no último dia do décimo primeiro mês, ele a levou a um
quarto que ela nunca tinha visto, onde havia uma roca e um banco. O Rei
explicou-lhe: "Amanhã, minha querida, você virá para aqui, onde passará
todo o mês, fiando cinco meadas por dia. Um empregado trará suas refeições e, à
noite, eu virei recolher sua tarefa. Se não estiver pronta, já sabe o que lhe
acontecerá, não é?" Dito isso, retirou-se. A moça ficou muito nervosa. Ela
nunca soubera fiar. Que seria dela, sem ter quem a ajudasse? Foi até a cozinha
e sentou-se num banco, chorando. Daí a momentos, ouviu uma pancada leve na
porta. Levantou-se e abriu-a. O que viu foi simplesmente um animalzinho preto,
muito pequeno e esquisito, com uma cauda longa que balançava sem parar.
"Porque está chorando?" perguntou ele. "Quem é você?"
retrucou ela. "Não se preocupe com isso." continuou o bichinho.
"Porque terei que fazer uma coisa que não sei. Se não a fizer, estarei
perdida." E contou-lhe a história toda, desde o começo. "Esteja
tranquila, pois vou ajudá-la. Todas as manhãs, baterei à sua janela para
apanhar a linha e, à noite, trarei as cinco meadas prontas." "Que lhe
darei em troca deste favor?" perguntou ela. "Você terá que adivinhar
meu nome, ou eu contarei tudo a seu marido." "Está bem!" concordou
ela. Balançando a cauda, o animalzinho retirou-se.
No dia seguinte, o Rei levou-a ao quarto onde
já estava a linha para fiar. Fechou a porta por fora e foi-se embora. Mal ele
havia saído, bateram de leve à janela. A moça foi espiar e lá estava o
animalzinho preto. Ela então lhe entregou a linha. À noitinha, a moça ouviu
nova pancada na janela. Abriu-a e seu protetor colocou em suas mãos cinco
meadas muito bem fiadas. "Agora, responda-me, qual é o meu nome?"
perguntou ele. "Será Juquinha?" O bichinho sacudiu a cabeça
negativamente. "Será Tonico?" Ele continuou a sacudir a cabeça e
balançava a cauda cada vez mais depressa. "Será Maneco?"
"Não!" disse ele e saiu correndo. Quando o Rei voltou, à noite,
encontrou as meadas prontas e disse: "Muito bem, minha querida. Amanhã
você receberá mais linha para continuar sua tarefa."
E assim sempre acontecia. Pela manhã lhe
traziam a linha e, às horas certas, um empregado aparecia com as refeições. O
animalzinho preto aparecia cedo para apanhar a linha e voltava ao anoitecer,
trazendo as meadas prontas. A moça passava os dias pensando qual seria o nome
do bichinho, mas nunca o descobria. Afinal, chegou a véspera do último dia. À
noite, quando o animalzinho apareceu, perguntou-lhe: "Já descobriu meu
nome?" Ela fez novas tentativas: "Chiquinho? Janico?" Cada vez o
bichinho sacudia mais a cauda e seus olhinhos brilhavam, cheios de malícia.
"Escute, você só tem o dia de amanhã para adivinhar, do contrário..."
Avisou ele, e saiu correndo.
A moça ficou horrorizada. Logo a seguir, ouviu
os passos de seu marido que vinha vindo. Quando ele entrou, ela lhe entregou as
cinco meadas prontas e ele lhe disse: "Amanhã é o último dia. Tome
cuidado, se não aprontar sua tarefa, perderá a vida. Hoje vou jantar aqui com
você." Entrou um empregado trazendo o jantar e outro banquinho para o Rei.
Os dois sentaram-se e o Rei começou a rir. "Porque está rindo?"
perguntou a moça. "Porque hoje vi uma coisa muito interessante."
respondeu ele. Pela manhã, saí para caçar. Fui andando pela mata e cheguei a um
lugar que nunca havia visto antes. Sentei-me um instante para descansar e ouvi
um barulhinho estranho. Levantei-me para verificar o que havia. Olhei para
todos os lados e, afinal, atrás de uma árvore, descobri um animalzinho preto,
muito pequeno e esquisito, com uma cauda comprida que agitava sem parar. À sua
frente estava uma roca, onde ele fiava com rapidez espantosa. Enquanto fazia
isso, ia cantando: "Eu sou todo pretinho, pareço um tição. Meu nome é
Tiquinho, Tiquinho de Carvão."
O coração da moça deu um salto ao ouvir isso.
Ela quase gritou de alegria, mas conservou-se muito quietinha no banco, sem
dizer palavra. Na manhã seguinte, o bichinho veio apanhar a linha. Quando a
noite já vinha chegando, apareceu ele, trazendo de volta as meadas. Seus
olhinhos brilhavam mais maliciosos do que nunca e a caudinha girava sem parar
um instante. "Qual é o meu nome?" perguntou ele. "Será
Salomão?" indagou ela. "Não." respondeu ele.
"Zebedeu?" tornou a perguntar a moça. "Não, entretanto, vou
dar-lhe mais uma oportunidade. Se ainda não acertar, já sabe o que vai
acontecer..." A moça deu uma grande gargalhada e disse: "Tu és todo
pretinho, pareces um tição. Teu nome é Tiquinho, Tiquinho de Carvão."
Quando o animalzinho ouviu isso, deu um guincho
horrível, saiu correndo pela escuridão a dentro e nunca mais apareceu. Mais
tarde veio o Rei. Apanhou as meadas e tirou a moça do quarto. No dia seguinte,
ofereceu um banquete à esposa, para o qual convidou todas as pessoas da cidade.
Havia, na mesa, as tortas mais deliciosas que se possa imaginar. A moça, no
entanto, lembrando-se dos maus momentos por que tinha passado, por ter comido
cinco tortas de uma vez, não quis provar nenhuma...
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